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Crime de Apropriação Indébita Previdenciária – Inexigibilidade de Conduta Diversa

Existe a possibilidade de afastamento de pena oriunda do crime de apropriação indébita previdenciária, conforme veremos a seguir.O crime de apropriação indébita previdenciária está previsto no artigo 168-A, do Código Penal, o qual dispõe:”Art.168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e na forma legal ou convencional: Pena- reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa”. Trata-se de crime omissivo próprio, em que o tipo objetivo é realizado pela simples conduta de não repassar aos cofres previdenciários as contribuições descontadas dos salários dos seus empregados. Ocorre, que face a conjuntura econômica, muitas empresas passam por severas dificuldades financeiras, e seus dirigentes se vêem obrigados ao não repasse das referidas contribuições, temendo a não continuidade empresarial. Sendo provadas pelo administrador as dificuldades que se encontra a pessoa jurídica, com repercussão inclusive na sua vida pessoal, impera-se o afastamento da pena prevista no artigo 168-A do Código Penal, pois inexigível conduta diversa. Este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), conforme se verifica: Superior Tribunal de Justiça ProcessoREsp 888947 / PBRECURSO ESPECIAL2006/0207474-2 Relator(a)Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA (1128) Órgão JulgadorT5 – QUINTA TURMAData do Julgamento03/04/2007Data da Publicação/FonteDJ 07.05.2007 p. 364Ementa PROCESSUAL PENAL. recurso especial. APROPRIAÇÃO INDÉBITAPREVIDENCIÁRIA. PRESCINDIBILIDADE DO ESPECIAL FIM DE AGIR OU DOLOESPECÍFICO (ANIMUS REM SIBI HABENDI). CRIME OMISSIVO PRÓPRIO.REGISTRO EM LIVROS CONTÁBEIS E DECLARAÇÃO À PREVIDÊNCIA SOCIAL DOSDESCONTOS NÃO RECOLHIDOS. IRRELEVÂNCIA. DIFICULDADES FINANCEIRAS.EXCLUDENTE DA CULPABILIDADE. ÔNUS DE PROVA DA DEFESA. INDÍCIOS.INADMISSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. O dolo do crime de apropriação indébita previdenciária é aconsciência e a vontade de não repassar à Previdência, dentro doprazo e na forma da lei, as contribuições recolhidas, não seexigindo a demonstração de especial fim de agir ou o dolo específicode fraudar a Previdência Social como elemento essencial do tipopenal.2. Ao contrário do que ocorre na apropriação indébita comum, não seexige o elemento volitivo consistente no animus rem sibi habendipara a configuração do tipo inscrito no art. 168-A do Código Penal.3. Sendo assim, o registro nos livros contábeis e a declaração aoPoder Público dos descontos não recolhidos, conquanto sejamutilizados para comprovar a inexistência da intenção de se apropriardos valores arrecadados, não têm reflexo na apreciação do elementosubjetivo do referido delito.4. Trata-se de crime omissivo próprio, em que o tipo objetivo érealizado pela simples conduta de deixar de recolher ascontribuições previdenciárias aos cofres públicos no prazo legal,após a retenção do desconto.5. A alegada impossibilidade de repasse de tais contribuições emdecorrência de crise financeira da empresa constitui, em tese, causasupralegal de exclusão da culpabilidade – inexigibilidade de condutadiversa –, e, para que reste configurada, é necessário que ojulgador verifique a sua plausibilidade, de acordo com os fatosconcretos revelados nos autos, não bastando para tal a referência ameros indícios de insolvência da sociedade.6. O ônus da prova, nessa hipótese, compete à defesa, e não àacusação, por força do art. 156 do CPP.7. Recurso conhecido e provido para denegar a ordem de habeas corpuse, conseqüentemente, determinar o prosseguimento da Ação Penal.AcórdãoVistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acimaindicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunalde Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe darprovimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs.Ministros Felix Fischer e Laurita Vaz votaram com o Sr. MinistroRelator.Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Gilson Dipp. ProcessoREsp 881423 / RJRECURSO ESPECIAL2006/0173271-0 Relator(a)Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA (1128) Órgão JulgadorT5 – QUINTA TURMAData do Julgamento15/03/2007Data da Publicação/FonteDJ 23.04.2007 p. 307Ementa PROCESSUAL PENAL. recurso especial. APROPRIAÇÃO INDÉBITAPREVIDENCIÁRIA. PRESCINDIBILIDADE DO ESPECIAL FIM DE AGIR OU DOLOESPECÍFICO (ANIMUS REM SIBI HABENDI). CRIME OMISSIVO PRÓPRIO.DIFICULDADES FINANCEIRAS. EXCLUDENTE DA CULPABILIDADE. ÔNUS DADEFESA. RECURSO PROVIDO.1. O dolo do crime de apropriação indébita previdenciária é aconsciência e a vontade de não repassar à Previdência, dentro doprazo e na forma da lei, as contribuições recolhidas, não seexigindo a demonstração de especial fim de agir ou o dolo específicode fraudar a Previdência Social como elemento essencial do tipopenal.2. Ao contrário do que ocorre na apropriação indébita comum, não seexige o elemento volitivo consistente no animus rem sibi habendipara a configuração do tipo inscrito no art. 168-A do Código Penal.3. Trata-se de crime omissivo próprio, em que o tipo objetivo érealizado pela simples conduta de deixar de recolher ascontribuições previdenciárias aos cofres públicos no prazo legal,após a retenção do desconto.4. A alegada impossibilidade de repasse de tais contribuições emdecorrência de crise financeira da empresa constitui, em tese, causasupralegal de exclusão da culpabilidade – inexigibilidade de condutadiversa – e, para que reste configurada, é necessário que o julgadorverifique a sua plausibilidade, de acordo com os fatos concretosrevelados nos autos.5. O ônus da prova, nessa hipótese, compete à defesa, e não àacusação, por força do art. 156 do CPP.6. Recurso conhecido e provido para anular o Acórdão recorrido, bemcomo a sentença, e determinar o retorno dos autos à primeirainstância, a fim de que, afastada a tese em que se apoiava aabsolvição, prossiga no exame da denúncia.AcórdãoVistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acimaindicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunalde Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe darprovimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs.Ministros Felix Fischer e Laurita Vaz votaram com o Sr. MinistroRelator.Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Gilson Dipp. Supremo Tribunal Federal AI 553882 / RS – RIO GRANDE DO SULAGRAVO DE INSTRUMENTORelator(a): Min. CEZAR PELUSOJulgamento: 01/12/2006PublicaçãoDJ 19/12/2006 PP-00076PartesAGTE.(S): PAULO FERNANDO CHANAN E OUTRO(A/S)AGTE.(S): VÂNIA MARIA MARTINI CHANANADV.(A/S): GUILHERME RUSCHEL MICHAELSEN E OUTRO(A/S)AGDO.(A/S): MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALDespachoDECISÃO: 1. Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, na instância de origem, indeferiu processamento de recurso extraordinário interposto contra Acórdão assim ementado: “PENAL. OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ART. 168-A, I, DO CP. DIFICULDADES FINANCEIRAS. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. COMPROVAÇÃO. PENA-BASE. DIAS-MULTA. SUBSTITUIÇÃO POR DUAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. 1. Uma vez reconhecidas a materialidade e a autoria, a consumação do crime descrito no art. 168-A do CP se dá tão-somente com o não recolhimento das contribuições previdenciárias no prazo legal. 2. A incidência da causa supra legal de exclusão da culpabilidade, caracterizada pelas dificuldades financeiras, depende de robusto conjunto probatório nos autos, a demonstrar a total impossibilidade do cumprimento das obrigações junto à previdência social, em razão de séria crise financeira da empresa, com repercussão na vida pessoal dos administradores. 3. Circunstâncias judiciais normais ao tipo penal autorizam a fixação da pena-base no mínimo legal. Inexistentes atenuantes ou agravantes. 4. A quantidade de dias-multa deve ser consentânea com o quantum da pena de reclusão. 5. Os valores do dia-multa devem ser estabelecidos observando-se a situação econômica do condenado. 6. Pena privativa de liberdade substituída por duas restritivas de direitos, nas modalidades de prestação de serviços à comunidade e de prestação pecuniária, de acordo com o entendimento desta Turma.” (fls. 120) O recorrente, com base no art. 102, III, a, alega violação ao disposto no art. 5º, incs. LVI, da Constituição Federal, sustentando ausência de dolo e necessidade de se reconhecer a retroatividade da lei posterior mais benéfica, e pugna, ainda, pelo reconhecimento da excludente de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa. 2. Improcedente o recurso. Esta Corte tem entendido que o art. 3o da Lei nº 9.983/2000 apenas transportou a base legal de imputação de apropriação indébita previdenciária para o Código Penal, sem alterar a descrição da conduta anteriormente incriminada pela Lei nº 8.212/90, de sorte que, por conta da persistência integral dos elementos típicos, inclusive do dolo, é impróprio falar-se em abolitio criminis, no caso. Nesse sentido: “HABEAS CORPUS” – CRIME CONTRA A ORDEM PREVIDENCIÁRIA (APROPRIAÇÃO INDÉBITA) – ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DA “ABOLITIO CRIMINIS” EM VIRTUDE DA REVOGAÇÃO DO ART. 95, “D”, DA LEI Nº 8.212/91 – PRETENDIDO RECONHECIMENTO DE AUSÊNCIA DE CULPABILIDADE – INDAGAÇÃO DE ORDEM PROBATÓRIA -INADMISSIBILIDADE NA VIA ESTREITA DO “WRIT” CONSTITUCIONAL – PEDIDO INDEFERIDO. “HABEAS CORPUS” E ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE TIPICIDADE PENAL E DE CULPABILIDADE. – O caráter sumaríssimo da via jurídico-processual do “habeas corpus” não permite que se proceda, no âmbito estreito desse “writ” constitucional, a qualquer indagação de ordem probatória, notadamente se a impetração objetivar a análise, discussão e valoração da prova penal. Não se revela viável, desse modo, em sede de “habeas corpus”, o exame da alegação de ausência de dolo na conduta imputada ao agente. Precedentes. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. – O crime de apropriação indébita contra a Previdência Social continua tipificado no ordenamento positivo, nos termos do art. 168-A do Código Penal, não obstante a derrogação do art. 95, “d”, da Lei nº 8.212/91. A superveniência da Lei nº 9.983/2000 (art. 3º) não implicou alteração na descrição normativa da conduta anteriormente incriminada, pois o art. 3º da referida Lei nº 9.983/2000, longe de provocar a descaracterização típica do comportamento delituoso, “apenas transmudou a base legal de imputação para o Código Penal, continuando sua natureza especial em relação à apropriação indébita simples, prevista no art. 168 do CP”” (HC nº 84.021, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ de 20.04.2006). “RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. NÃO-RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. ABOLITIO CRIMINIS. INOCORRÊNCIA. DIFICULDADE FINANCEIRA. MATÉRIA PROBATÓRIA. 1. O artigo 3º da Lei n. 9.983/2000 apenas transmudou a base legal da imputação do crime da alínea “d” do artigo 95 da Lei n. 8.212/1991 para o artigo 168-A do Código Penal, sem alterar o elemento subjetivo do tipo, que é o dolo genérico. Daí a improcedência da alegação de abolitio criminis ao argumento de que a lei mencionada teria alterado o elemento subjetivo, passando a exigir o animus rem sibi habendi. 2. A pretensão visando ao reconhecimento de inexigibilidade de conduta diversa, traduzida na impossibilidade de proceder-se ao recolhimento das contribuições previdenciárias, devido a dificuldades financeiras, não pode ser examinada em habeas corpus, por demandar reexame das provas coligidas na Ação Penal. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento” (RHC nº 86.072, Rel. Min. EROS GRAU, DJ de 28.10.2005). Cf., ainda, HC nº 87.107-MC, Rel. Min. CEZAR PELUSO, DJ de 16.02.2006; RE nº 408.363, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJ de 18.04.2005; RHC nº 87.303-MC, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, DJ de 15.12.2005. Não é outra a opinião da doutrina, como se vê a ALBERTO SILVA FRANCO, ao comentar o disposto no art. 168-A, do Código Penal: “Não há cogitar, no entanto, com a promulgação da Lei 9.983/2000, de abolitio criminis a não ser em relação à alínea j do art. 95 da Lei 8.212/91. Embora houvesse explícita revogação, no art. 3.º da Lei 9.983/2000, em relação a todas as alíneas do art. 95 da Lei 8.212/91, força é convir que essa revogação não tem o condão de desconsiderar os crimes previdenciários praticados anteriormente à Lei 9.983/2000 para efeito de aplicação do art. 2.º do Código Penal, conforme o entendimento de Luiz Henrique Pinheiro Bittencourt (“A abolitio criminis do art. 95 da Lei 8.212/91, pela Lei 9.983, de 14 de julho de 2000″, in Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, outubro de 2000, n. 95, p. 15). Este posicionamento é inaceitável. Os crimes previdenciários existiam antes e continuaram a existir depois da Lei 9.983/2000. Esta não é, portanto, lei posterior que descriminalizou os agravos contra a previdência social constantes do art. 95 da Lei 8.212/91. Pouco importa a existência de dificuldades no enquadramento das sanções relativas ao art. 95 da Lei 8.212/91 e que a Lei 9.983/2000 tenha reproduzido, com alterações, os tipos previdenciários anteriormente estruturados. A revogação do art. 95 da Lei 9.983/2000 significou apenas que, a partir da entrada em vigor da nova lei, os crimes previdenciários foram inseridos no Código Penal. Mas os fatos ocorridos antes dessa vigência continuam a ser regrados pelo art. 95 da Lei 8.212/91, admitindo-se tão somente que a pena privativa de liberdade relativa à apropriação indébita previdenciária tenha retroatividade, mesmo no período da vacatio legis (sobre essa matéria, vide o art. 2.º, item 1.02 f) porque o máximo da sanção punitiva é inferior à cominada pelo art. 5.º da Lei 7.492/86, estabelecida como preceito sancionatório para as hipóteses das alíneas d, e e f em virtude do § 1.º, do art. 95 da Lei 8.212/91” (ALBERTO SILVA FRANCO, Código Penal e sua interpretação jurisprudencial, 7. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, p. 2778). Por fim, quanto à alegação de inexigibilidade de conduta diversa, observo que o Acórdão impugnado decidiu a causa com base no conjunto fático-probatório, de forma que, diante da impossibilidade de, em recurso extraordinário, rever a Corte as premissas de fato sobre as quais, para decidir a causa, se assentou o Tribunal de origem, à luz da prova dos autos, é evidente que, para adotar outra conclusão, seria mister reexame prévio do conjunto fático-probatório, coisa de todo inviável perante o teor da súmula 279. 3. Ante o exposto, nego seguimento ao agravo (arts. 21, § 1º, RISTF, 38 da Lei nº 8.038, de 28.05.1990, e 557 do CPC). Publique-se. Int. Brasília, 1° de dezembro de 2006. Ministro CEZAR PELUSO Relator 1LegislaçãoLEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 INC-00056 ****** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERALLEG-FED DEL-002848 ANO-1940 ART-00002 ART-00102 INC-00003 LET-A ART-00168 ART-0168A INC-00001 ****** CP-1940 CÓDIGO PENALLEG-FED LEI-005869 ANO-1973 ART-00557 ****** CPC-1973 CÓDIGO DE PROCESSO CIVILLEG-FED LEI-007482 ANO-1986 ART-00005 LEI DE CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO LEI ORDINÁRIALEG-FED LEI-008038 ANO-1990 ART-00038 LEI ORDINÁRIALEG-FED LEI-008212 ANO-1991 ART-00095 PAR-00001 LET-D LET-E LET-F LET-J LEI ORDINÁRIALEG-FED LEI-009983 ANO-2000 ART-00003 LEI ORDINÁRIALEG-FED RGI ANO-1980 ART-00021 PAR-00001 ****** RISTF-1980 REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERALLEG-FED SUM-000279 SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – STFObservaçãoLegislação feita por:(MGC).fim do documento RE 458229 / RS – RIO GRANDE DO SULRECURSO EXTRAORDINÁRIORelator(a): Min. CEZAR PELUSOJulgamento: 30/11/2006PublicaçãoDJ 08/02/2007 PP-00094PartesRECTE.(S): WILSON SILVEIRA MEDEIROSADV.(A/S): LUCIANO LOPES DE ALMEIDA MORAES E OUTRO(A/S)RECDO.(A/S): MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALDespachoDECISÃO: 1. Trata-se de recurso extraordinário interposto contra Acórdão do Tribunal Regional Federal da 4a Região assim ementado: “PENAL. OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. LEI 8.212/91. ART. 95, “D” E CÓD. PENAL, ART. 168-A. ANISTIA DO ART. 11, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 9.639/98. INAPLICABILIDADE. PRISÃO POR DÍVIDA. PACTO DE SAN JOSE DA COSTA RICA. DOLO. DIFICULTADES FINANCEIRAS. 1. O crime de omitir-se no recolhimento de contribuições previdenciárias, ainda que topograficamente incluído no art. 168 do Código Penal, não é apropriação indébita, pois se consuma com a simples omissão da conduta, independentemente de qualquer resultado finalístico para a sua consumação. 2. Não se estende aos agentes particulares a anistia prevista no art. 11, parágrafo único, da Lei 9.639/98. 3. A prisão decorrente do crime de omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias não constitui prisão por dívida e nem ofende ao Pacto de San José da Costa Rica. 4. O dolo no crime de omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias é a vontade livre e consciente de não recolher aos cofres públicos as importâncias descontadas dos empregados, sendo irrelevantes se o agente pretende delas apropriar-se ou dar-lhes outro destino. 5. Para o reconhecimento da excludente de culpabilidade por dificuldades financeiras, é necessária a existência de prova documental que demonstrar cabalmente a impossibilidade de se efetuar os recolhimentos previdenciários.” (fls. 526) O recorrente, com base no art. 102, III, a, alega violação ao disposto no art. 5º, caput e inc. LXVII, da Constituição Federal. Opinou a Procuradoria-Geral da República pelo não conhecimento do recurso e, caso conhecido, pelo desprovimento (fls. 611-613) 2. Improcedente o recurso. Esta Corte tem entendido que o art. 3o da Lei nº 9.983/2000 apenas transmudou a base legal de imputação de apropriação indébita previdenciária para o Código Penal, não havendo alteração na descrição da conduta anteriormente incriminada pela Lei nº 8.212/91, de sorte que, por conta da manutenção integral dos elementos típicos, inclusive quanto ao dolo, é impróprio falar-se em abolitio criminis, no caso. Nesse sentido: “HABEAS CORPUS” – CRIME CONTRA A ORDEM PREVIDENCIÁRIA (APROPRIAÇÃO INDÉBITA) – ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DA “ABOLITIO CRIMINIS” EM VIRTUDE DA REVOGAÇÃO DO ART. 95, “D”, DA LEI Nº 8.212/91 – PRETENDIDO RECONHECIMENTO DE AUSÊNCIA DE CULPABILIDADE – INDAGAÇÃO DE ORDEM PROBATÓRIA -INADMISSIBILIDADE NA VIA ESTREITA DO “WRIT” CONSTITUCIONAL – PEDIDO INDEFERIDO. “HABEAS CORPUS” E ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE TIPICIDADE PENAL E DE CULPABILIDADE. – O caráter sumaríssimo da via jurídico-processual do “habeas corpus” não permite que se proceda, no âmbito estreito desse “writ” constitucional, a qualquer indagação de ordem probatória, notadamente se a impetração objetivar a análise, discussão e valoração da prova penal. Não se revela viável, desse modo, em sede de “habeas corpus”, o exame da alega – O caráter sumaríssimo da via jurídico-processual do “habeas corpus” não permite que se proceda, no âmbito estreito desse “writ” constitucional, a qualquer indagação de ordem probatória, notadamente se a impetração objetivar a análise, discussão e valoração da prova penal. Não se revela viável, desse modo, em sede de “habeas corpus”, o exame da alegação de ausência de dolo na conduta imputada ao agente. Precedentes. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. – O crime de apropriação indébita contra a Previdência Social continua tipificado no ordenamento positivo, nos termos do art. 168-A do Código Penal, não obstante a derrogação do art. 95, “d”, da Lei nº 8.212/91. A superveniência da Lei nº 9.983/2000 (art. 3º) não implicou alteração na descrição normativa da conduta anteriormente incriminada, pois o art. 3º da referida Lei nº 9.983/2000, longe de provocar a descaracterização típica do comportamento delituoso, “apenas transmudou a base legal de imputação para o Código Penal, continuando sua natureza especial em relação à apropriação indébita simples, prevista no art. 168 do CP”” (HC nº 84.021, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ de 20.04.2006). “RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. NÃO-RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. ABOLITIO CRIMINIS. INOCORRÊNCIA. DIFICULDADE FINANCEIRA. MATÉRIA PROBATÓRIA. 1. O artigo 3º da Lei n. 9.983/2000 apenas transmudou a base legal da imputação do crime da alínea “d” do artigo 95 da Lei n. 8.212/1991 para o artigo 168-A do Código Penal, sem alterar o elemento subjetivo do tipo, que é o dolo genérico. Daí a improcedência da alegação de “RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. NÃO-RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. ABOLITIO CRIMINIS. INOCORRÊNCIA. DIFICULDADE FINANCEIRA. MATÉRIA PROBATÓRIA. 1. O artigo 3º da Lei n. 9.983/2000 apenas transmudou a base legal da imputação do crime da alínea “d” do artigo 95 da Lei n. 8.212/1991 para o artigo 168-A do Código Penal, sem alterar o elemento subjetivo do tipo, que é o dolo genérico. Daí a improcedência da alegação de abolitio criminis ao argumento de que a lei mencionada teria alterado o elemento subjetivo, passando a exigir o animus rem sibi habendi. 2. A pretensão visando ao reconhecimento de inexigibilidade de conduta diversa, traduzida na impossibilidade de proceder-se ao recolhimento das contribuições previdenciárias, devido a dificuldades financeiras, não pode ser examinada em habeas corpus, por demandar reexame das provas coligidas na Ação Penal. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento” (RHC nº 86.072, Rel. Min. EROS GRAU, DJ de 28.10.2005). Cf., ainda, HC nº 87.107-MC, Rel. Min. CEZAR PELUSO, DJ de 16.02.2006; RE nº 408.363, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJ de 18.04.2005; RHC nº 87.303-MC, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, DJ de 15.12.2005. Não é outra a opinião da doutrina, como pondera ALBERTO SILVA FRANCO, ao comentar o disposto no art. 168-A, do Código Penal: “Não há cogitar, no entanto, com a promulgação da Lei 9.983/2000, de abolitio criminis a não ser em relação à alínea j do art. 95 da Lei 8.212/91. Embora houvesse explícita revogação, no art. 3.º da Lei 9.983/2000, em relação a todas as alíneas do art. 95 da Lei 8.212/91, força é convir que essa revogação não tem o condão de desconsiderar os crimes previdenciários praticados anteriormente à Lei 9.983/2000 para efeito de aplicação do art. 2.º do Código Penal, conforme o entendimento de Luiz Henrique Pinheiro Bittencourt (“A abolitio criminis do art. 95 da Lei 8.212/91, pela Lei 9.983, de 14 de julho de 2000″, in Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, outubro de 2000, n. 95, p. 15). Este posicionamento é inaceitável. Os crimes previdenciários existiam antes e continuaram a existir depois da Lei 9.983/2000. Esta não é, portanto, lei posterior que descriminalizou os agravos contra a previdência social constantes do art. 95 da Lei 8.212/91. Pouco importa a existência de dificuldades no enquadramento das sanções relativas ao art. 95 da Lei 8.212/91 e que a Lei 9.983/2000 tenha reproduzido, com alterações, os tipos previdenciários anteriormente estruturados. A revogação do art. 95 da Lei 9.983/2000 significou apenas que, a partir da entrada em vigor da nova lei, os crimes previdenciários foram inseridos no Código Penal. Mas os fatos ocorridos antes dessa vigência continuam a ser regrados pelo art. 95 da Lei 8.212/91, admitindo-se tão somente que a pena privativa de liberdade relativa à apropriação indébita previdenciária tenha retroatividade, mesmo no período da vacatio legis (sobre essa matéria, vide o art. 2.º, item 1.02 f) porque o máximo da sanção punitiva é inferior à cominada pelo art. 5.º da Lei 7.492/86, estabelecida como preceito sancionatório para as hipóteses das alíneas d, e e f em virtude do § 1.º, do art. 95 da Lei 8.212/91” (ALBERTO SILVA FRANCO, Código Penal e sua interpretação jurisprudencial, 7. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, p. 2778). Em relação à suposta violação ao artigo 5°, LXVII, o Acórdão recorrido decidiu na linha da jurisprudência desta Corte, que entende não se confundirem a prisão civil por dívida e o crime de omissão do recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas dos empregados. Confira-se, a respeito: “APROPRIAÇÃO INDÉBITA. NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. PRISÃO CRIMINAL E, NÃO, CIVIL. INOCORRÊNCIA DE OFENSA AO ART. 5º, LXVII DA CF. AGRRE improvido.” (RE n° 391.996-AgR, Rel. Min. ELLEN GRACIE, DJ de 19.12.2003) No mesmo sentido: RE n° 414.545, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, DJ de 11.03.2004; RE n° 350.976, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 27.02.2004; RE n° 350.976, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 20.11.2003; AI n° 420.536, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 27.2.2003; RE n° 247.428, Rel. Min. NELSON JOBIM, DJ de 12.11.2002;; AI n° 366.390, Rel. Min. NELSON JOBIM, DJ de 18.10.2002; HC n° 78.234, Rel. Min. OCTÁVIO GALLOTTI, DJ de 21.5.1999. 3. Ante o exposto, nego seguimento ao recurso (arts. 21, § 1º, RISTF, 38 da Lei nº 8.038, de 28.05.1990, e 557 do CPC). Publique-se. Int. Brasília, 30 de novembro de 2006. Ministro CEZAR PELUSO Relator 1 Luiz Felipe Mallmann de MagalhãesAdvogado CriminalistaAv. Getúlio Vargas 774, conj. 302Menino DeusPorto Alegre/RSFone: (51) 3231.0370Celulares: (51) 9807.8593 / 9733.2441Site: www.luizfelipemagalhaes.com.brPossui escritórios correspondentesna Argentina, Uruguai, Equador, Peru, Venezuela, Estados Unidos, Espanha, Itália e Suíça.