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Princípios do processo administrativo

Introdução

Primeiramente, traçaremos o conceito de Processo Administrativo. O processo administrativo se consubstancia numa sucessão encadeada de fatos, juridicamente ordenados, destinados à obtenção de um resultado final, no caso a prática de um ato administrativo final, como bem assegura o autor José dos Santos Carvalho Filho . Temos, ainda, a definição trazida pelos doutrinadores Sérgio Ferraz e Adilson Abreu Dallari como sendo uma série de atos, lógica e juridicamente concatenados, dispostos com o propósito de ensejar a manifestação de vontade da Administração.

Durante muito tempo, não houve lei geral a regulamentar o processo ou procedimento administrativo, nem na esfera federal, tampouco estadual e municipal, mesmo com a edição da Constituição Federal de 1988 que consagrou, efetivamente, o processo administrativo. Somente no início de 1999, foi editada a primeira lei disciplinando o Processo Administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.

Essa tardia regulamentação do processo administrativo trouxe inúmeras conseqüências negativas aos administrados: a Administração atuava com inteira liberdade sobre o processo administrativo, decidindo, da forma que lhe conviesse, sobre a sua instauração, seu processamento, inclusive limitando a participação dos administrados. Além disso, resistia em conceder vistas dos autos do processo e ainda se recusava ao recebimento de petições, fazendo com que o interessado recorresse ao Judiciário, invocado as garantias constitucionais.

A Administração, portanto, revelava sua faceta autoritária, em contraponto à proposta democrática da lei n. 9.784/99. Logicamente, para se atingir a democratização, é preciso que a lei, além de atender aos requisitos formais, reflita propósitos éticos que assegurem uma efetiva proteção do cidadão em relação ao Estado.

O processo administrativo, então, surge como forma de limitar a vontade do Estado, materializando o Estado Democrático de Direito. A Administração, ao seguir parâmetros pré-definidos pela lei, instrumentaliza as exigências democráticas na atuação administrativa, diante do contexto sociopolítico do século XX, de forma a tutelar direitos que foram afetados pela Administração.

Princípios do processo administrativo

No processo administrativo incidem princípios exclusivos e princípios gerais, aplicáveis a outros institutos jurídicos. Optamos pela classificação utilizada pelos doutrinadores Sérgio Ferraz e Adilson Abreu Dallari .

Para a regularidade de desenvolvimento do processo administrativo e justiça das decisões, faz-se imperioso o bom emprego dos princípios jurídicos sobre ele incidentes, devendo-se observar o significado, a importância, os objetivos e as decorrências de ordem prática de cada um deles.

Antes da edição da lei 9.784/1999, a doutrina existente sobre processo administrativo e administração pública enumerava, com ligeiras mutações, os seguintes princípios: legalidade, informalidade, moralidade, publicidade e eficiência, além dos princípios da ampla defesa e contraditório (CF, art. 37). A Lei 9.784/1999 adicionou ao rol já conhecido outros “princípios”, a saber: finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, segurança jurídica e interesse público.

São vários, então, os “princípios” elencados pela Lei Geral do Processo Administrativo e apresentados no seu art. 2º.Embora não expressamente citados na lei, a administração também deve obediência aos princípios da publicidade, da oficialidade, do informalismo e da impessoalidade. No entanto, este artigo tecerá comentários somente sobre os explicitamente citados no art. 2º do referido diploma legal, trazendo à tona o seguinte questionamento: Os “princípios” previstos na Lei Federal n.º9.784/99 são, de fato, princípios?

O parágrafo único do mesmo dispositivo legal enumera exaustivamente os critérios a serem observados no âmbito da administração pública. Não se deve olvidar, contudo, que muitos desses critérios já estão implicitamente contidos naqueles princípios que norteiam a administração pública.

Princípio da Igualdade

A despeito de o Estado ocupar simultaneamente a qualidade de parte e de juiz no processo administrativo, deve ser assegurado ao particular-administrado um tratamento que lhe permita a compensação dessa desigualdade. A atuação do Estado deve ser a mais isenta possível na condução do processo, sob pena de infringir-se este postulado constitucional.

Deve-se buscar, acima de tudo, uma solução legal, justa e convincente e, para tanto, deve tratar as partes com isonomia. Na instrução e na decisão do processo administrativo a autoridade pública disso incumbida deve zelar pela maior igualdade possível entre as partes.

Princípio da Legalidade

O art. 37, caput, da Constituição pátria, preceitua que um dos princípios norteadores da Administração é o da Legalidade, sob pena de o administrador público ser responsabilizado por esta violação. A eficácia de todo desempenho da administração pública tem dependência da Lei, não há liberdade ou vontade pessoal do administrador. O que importa é a obediência aos ditames e regras previstas no direito positivo, por isso que, referir-se ao princípio da legalidade é mencionar o total condicionamento do administrador à pretensão da Lei.

O administrativista Hely Lopes Meirelles , ao discorrer sobre o significado do princípio da legalidade, ensina que “o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei, e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso”. A força de toda atividade administrativa, assim, estaria dependente ao atendimento da lei, não possuindo, como se disse, nenhuma liberdade nem vontade pessoal do administrador público, posto ser de ordem pública a lei administrativa.

Como bem ressaltam Sérgio Ferraz e Adilson Abreu Dallari , a previsão legislativa é condição de validade de uma atuação administrativa. Discorrem ainda que o princípio da legalidade não deve ser entendido apenas como um cumprimento formal do quanto disposto em lei, pelo contrário, requer uma observância especial ao espírito da lei e às circunstancias do caso concreto.Nessa mesma esteira de raciocínio, chegamos à seguinte conclusão: a atividade administrativa jamais poderá subverter o sistema legal, porquanto deverá agir em conformidade com o que determina a lei.

Princípio da Finalidade

A finalidade do ato é seu intento finalístico, é o norte da correta aplicação da lei. Todo ato administrativo procura atingir uma finalidade de interesse da administração pública. Tem-se que o princípio da finalidade exige que o ato seja praticado sempre com finalidade pública.

Este princípio proíbe que o ato administrativo venha a ser praticado sem interesse público ou conveniência para a administração, ansiando exclusivamente a atender interesses privados, por nepotismo ou encalço dos agentes da administração pública. Quando o administrador age em desconformidade com este princípio, há um desvirtuamento da lei. A sua conduta revela um desvio de poder, podendo ensejar a nulidade do ato.Prescreve o doutrinador Celso Antônio Bandeira de Melo que o princípio da legalidade não é apenas uma decorrência do princípio da legalidade, é inerência dele, correspondendo a aplicação da lei em conformidade com sua razão de ser, do seu objetivo. Assim, a finalidade seria um elemento da própria lei, é o fator que proporciona entendê-la.

Comungamos com o entendimento do doutrinador supra mencionado. Acreditamos, assim, que a finalidade encontra-se intimamente ligada a legalidade na medida em que para que o ato administrativo seja legal é necessário que se atente para o espírito da lei. Falamos em finalidade legal que, ao nosso ver, nada mais é do que a congruência da finalidade e da legalidade.

Princípio da Motivação

O art. 93, IX, da CF/88, prevê que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e todas as decisões serão fundamentadas, sob pena de nulidade. Na lei 9.784/99, esse mesmo princípio é consagrado no art. 2º, VII, que determina que a decisão do administrador deverá ter a indicação dos pressupostos de fato e de direito que a ensejarem.

A partir da apreciação da motivação dos atos emanados da administração pública, é possível aferir, exercendo o controle de legalidade, se o ato administrativo foi praticado em conformidade com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Os motivos devem ser aduzidos previamente, ao tempo da expedição do ato. Acaso intempestivos, ou insuficientemente motivados, são ilegítimos e invalidáveis pelo Poder Judiciário.O princípio da motivação é um direito político e implícito do cidadão e deriva do Estado Democrático de Direito. Ato administrativo sem motivação afronta o poder discricionário, enveredando nas raias do arbítrio.

Sérgio Ferraz e Adilson Abreu Dallari , discorrendo sobre a importância da motivação, ensinam que sem a elucidação dos motivos fica difícil ou mesmo frustrada a possibilidade de recorrer daquela decisão, inclusive perante o Poder Judiciário. A Administração precisa indicar, além do dispositivo legal como supedâneo de sua decisão, os fatos, as interferências feitas e os fundamentos de sua decisão.

Assim é que, nesse mesmo sentido, Lúcia Valle Figueiredo , em artigo publicado, elucida que a fundamentação das decisões administrativas e a razoabilidade de tais decisões são de cabal importância para sua validade, pouco importando o fato de não estar a motivação expressa no art. 37. Aduz ainda que a motivação é a explicitação das razões que levam o administrador a decidir de uma maneira ou de outra, diante de determinada situação, diante de determinados pressupostos, diante de determinados fatos.

Fica, neste sentido, claro e evidente a necessidade de fundamentação e justificação dos atos nas decisões e no transcorrer do processo administrativo pela administração pública, condutora do litígio em questão.

2.5 Princípio da Razoabilidade e ProporcionalidadeA despeito de não ter referência constitucional expressa, o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade possui registro na Constituição Federal.

Com propriedade, Maria Paula Dallari Bucci define o significado da razoabilidade. Para ela, o princípio da razoabilidade pode ser definido como aquele que exige proporcionalidade, justiça e adequação entre os meios utilizados pelo Poder Público, no exercício de suas atividades – administrativas ou legislativas -, e os fins por ela almejados, levando-se em conta critérios racionais e coerentes.

O princípio da razoabilidade exprime a relação de congruidade entre o fato (motivo) e desempenho concreto da administração pública, como bem assevera a prof. Lúcia Valle Figueiredo . O processo administrativo deverá obedecer aos critérios aceitáveis do ponto de vista racional, consoante a decisão normal de pessoas equilibradas. As condutas diversas sujeitar-se-ão à ilegitimidade, podendo ser invalidáveis jurisdicionalmente, com fundamento no art. 37, da Constituição Federal.

A lei confere ao administrador certa margem de discricionariedade, mas a providencia adotada deverá ser a mais adequada ao interesse social e à racionalidade.

No mesmo sentido, o princípio da proporcionalidade enuncia a idéia de que as competências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e intensidade proporcionais ao que seja realmente demandado para o cumprimento da finalidade do interesse público a que estão atreladas. Atos desproporcionais são ilegais.

O princípio da razoabilidade encontra-se esculpido no art. 2, parágrafo único, VI, que estabelece que nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público.

2.6 Princípio da Moralidade

O princípio da moralidade administrativa está inserido na Constituição Federal, mais precisamente no art. 5º, LXXIII, como um princípio fundamental a ser respeitado pela Administração Pública, e, especificamente em relação ao processo administrativo, no art. 50, da Lei n. 9.784/99, prevendo a anulação de todo e qualquer ato administrativo que tenha sido praticado sob o vício da imoralidade, por intermédio de ação popular.

A moral administrativa deve orientar a conduta do administrador público. Quando da tomada de providências administrativas, o administrador deverá consultar sua consciência profissional, orientado pelos valores e princípios do direito público, aquilatando qual deva ser a postura mais adequada a seguir diante da ocorrência administrativa.

Concluímos, portanto, que a moralidade administrativa acarreta para a Administração Pública o dever de agir com boa-fé, lealdade e transparência, respeitando as expectativas legítimas geradas nos administrados.

Princípio da Ampla Defesa e do Contraditório

Como uma das manifestações do due process of law, em sentido processual, exige-se a observância do contraditório e da ampla defesa, de que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Entende-se como ampla defesa a total possibilidade do cidadão, nos moldes assegurados por lei, de efetivar a defesa quando venha a ser acusado de qualquer violação da lei, seja ela penal ou administrativa. É a oportunidade conferida ao acusado de resistir à acusação.

O contraditório, por sua vez, se expressa na possibilidade de fazer emergir os diferentes interesses em jogo e de confrontá-los adequadamente em presença de seus titulares, é claro, anteriormente à decisão final.

Na lição de Nelson Nery Júnior , por contraditório deve-se entender, de um lado, a necessidade de dar conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo às partes; e de outro, a possibilidade das partes reagirem aos atos que lhe sejam desfavoráveis. Os contendores têm direito de deduzir suas pretensões e defesas, realizarem as provas que requereram para demonstrar a existência de seu direito, em suma, direito de serem ouvidos paritariamente no processo em todos os seus termos.

Princípio da Segurança Jurídica

A segurança jurídica exerce fundamental papel na efetivação real dos fundamentos e desígnios do Estado Democrático de Direito. Viabiliza a harmonia das relações cotidianas fornecendo a existência do verdadeiro direito, base de apoio da sociedade, como único meio possível de garantir e prevalecer a justiça. Assim sendo, a segurança jurídica tem, no processo administrativo, por finalidade primordial a garantia da certeza da aplicação justa da lei, conforme os ditames jurídicos de direito, evitando que sejam desconstituídos, sem justificativa plausível, os atos ou situações jurídicas, ainda que tenha ocorrido alguma inadequação com o texto legal no decorrer de sua constituição.Encontra-se, ainda, consagrado no art. 2°, XIII, e no art. 55, ambos da Lei Geral do Processo Administrativo.

Princípio da Supremacia do Interesse Público

Sob a ótica de Celso Antônio Bandeira de Mello , o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, é da essência de qualquer Estado, de qualquer sociedade juridicamente organizada com fins políticos.

Cumpre arrematar, enfim, o conceito do que seja “interesse público”. O interesse público, portanto, nada mais é do que uma dimensão, uma determinada expressão dos direitos individuais, vista sob um prisma coletivo. O aludido princípio é melhor definido, mais uma vez, por Celso Antônio Bandeira de Mello como sendo o interesse resultante do conjunto de interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua qualidade de membros da Sociedade e pelos simples fato de o serem.

Princípio da Eficiência

Acrescentado ao art. 37 da CF pela Emenda Constitucional n° 19/1998, o princípio da eficiência busca garantir o máximo de aproveitamento possível aos meios de atuação disponíveis, dando-se maior ênfase ao exame da legitimidade, da economicidade e da razoabilidade, privilegiando a eficiência em detrimento das concepções puramente formalísticas.