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A interpretação da lei penal

Ao poder legislativo, na sua função legiferante, é atribuído à aprovação de leis, pois, são os legítimos representantes do povo. Essas leis, por ser obra humana e, portanto, passível de falhas, repleta de dúvidas e significados, a necessidade de interpretação é incontestável. Simplesmente escrita em códigos, seja de matéria penal, cível, processual, eleitoral ou até mesmo a própria Bíblia sagrada, simplesmente no papel ela é estática, inerte e somente constitui sua dinâmica quando interpretada e aplicada.

É necessária a interpretação da lei vigente e é de fundamental a renovação, reformulação das leis com o decorrer do tempo e conseqüentemente com as mudanças das concepções da sociedade. Pois, as leis são expressões e conseqüência das vontades e necessidades sociais. Caso contrário cria-se um forte impasse entre o imobilismo das leis e a dinâmica dos fatos sociais.

Interpretar é o ato de explicar o sentido de alguma coisa; é revelar o significado de uma expressão verbal ou escrita. Consiste na busca de decodificar o verdadeiro sentido das coisas.

Interpretar o direito ou a lei é revelar o sentido e o alcance de suas expressões.

Para os doutrinadores romanos: Ulpiano “Embora claríssimo o édito do pretor, não cabe descuidar de sua interpretação”. Já para Celso “Saber as leis não consiste em conhecer-lhes as palavras, mas sua força e poder”.

Para o ilustríssimo cearense Clóvis Beviláqua a interpretação da lei é; “Revelar o pensamento que anima suas palavras”. Referindo-se ao pensamento da lei, a sua alma, e não a sua letra pura e simples.

Interpretar é incorporar o espírito do legislador no seu e buscar o que ele desejava e imaginava e que por outros motivos não conseguiu cristalizar através da letra da lei.

Não concretizados todos os desejos do legislador, pairando dúvidas quanto aos sentidos das normas. É tarefa do operador do direito, interpretar e entender a mensagem da lei, o conteúdo espiritual da norma, seja para fixar-lhe corretamente o sentido ou para determinar-lhe seu campo de incidência.

Em determinados momentos da História humana, tentaram cercear a manifestação dos doutrinadores e dos interpretes das leis, não aceitando qualquer forma de interpretação. O Imperador Justiniano em seu Corpus Júris Civilis dizia: “Quem ousar tecer comentários à nossa lei cometerá crime de falso, e suas obras serão apreendidas e destruídas”.

Napoleão Bonaparte, no Código Civil francês de 1804 afirmava: “Os intérpretes corrompem a lei, os advogados a matam”. Havia nessas épocas a errônea idéia de que o papel do intérprete era torcer o significado das leis para colocá-las de acordo com seus interesses.

Tudo se interpreta, tudo está passível a aperfeiçoamento, clarear o obscuro, simplificar o confuso. Nosso próprio Código de Processo Penal reconheceu esta verdade quando declara que até mesmo o silêncio se interpreta, exposto no seu artigo 186 § único. Art. 186 § único C.P.P.

O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa. A interpretação das leis é no mínimo estudada em três fontes: Quanto ao sujeito, quanto ao modo e quanto ao resultado.

A interpretação quanto ao sujeito, ou seja, quanto à origem de que provém. Pode ser:

-Autêntica é quando a interpretação é dada pela própria lei, ou seja, no seu próprio texto, num dos seus dispositivos, explica como deve ser entendido determinado assunto ou norma. Exemplo claro é o art. 327 do Código Penal que diz o que deve ser entendido por funcionário público. E o art. 150 do mesmo código que diz o que deve e o que não deve ser entendido pela palavra casa. Art. 327 C.P.

Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.

-Doutrinária é a interpretação dada pelos doutores e estudiosos do direito, através artigos, teses e livros.

-Jurisprudencial é a de autoria de juízes e tribunais, devendo apenas traduzir o sentido e o alcance nela contido, vedado substituir o critério do legislador pelo seu próprio. Para Sávio de Figueiredo, “Se o juiz não pode tomar liberdades inadmissíveis com a lei, julgando contra legem, pode e deve, por outro lado, optar pela interpretação que mais atenda as aspirações da justiça e do bem comum”.

Quanto ao modo pode ser:

-Gramatical, fundada nas regras gramaticais; -Teleológica, que visa descobrir a finalidade com que a lei foi criada; -Lógica, que procura reconstruir o pensamento do legislador; -Histórica, que procura avaliar a conjuntura e as circunstâncias em que a lei foi criada ou que provocaram a sua criação; -Sociológica, procura adaptar o sentido das leis com as necessidades sociais, previsto no art. 5º da lei de introdução ao código civil. Art.5º L.I.C.C.Na aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. Quanto ao resultado, pode ser:

-Declarativa, Quando se conclui que a letra da lei corresponde exatamente ao pensamento do legislador. Ex: art. 141. Inciso III do Código Penal, onde se deve entender que o número mínimo de pessoas é três, pois, sempre que a lei se contenta com duas pessoas ela diz expressamente. Art. 141, III C.P.Na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da Calúnia, da Difamação ou da Injúria. -Restritiva, quando se conclui que a lei diz mais do que queria dizer o legislador. Ex: A emoção e a paixão, art. 28 inc. I do Código Penal; onde expressa que estas situações não excluem as responsabilidades, caso que devemos interpretar de maneira restritiva, pois, tendo causas patológicas tanto a emoção quanto a paixão levam a inimputabilidade penal, art. 126 do mesmo código. Art. 28, I C.P.Não excluem a imputabilidade penal: – A emoção ou a paixão

Art. 126 CAPUT C.P.É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

-Extensiva, quando se conclui que a lei diz menos do que queria dizer o legislador; ex: art. 235 do Código Penal, que pune a Bigamia, onde extensivamente se aplica a Poligamia. Este tipo de interpretação é inclusive prevista no art. 3º do Código de Processo Penal.

Art. 235 C.P.Contrair alguém, sendo casado novo casamento:

Art. 3º C.P.P.A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como suplemento aos princípios gerais do direito. O fato é que o legislador no momento da criação da lei não consegue prever quais os fatos concretos que surgirão para serem solucionados por determinada lei, daí ser fundamental a atuação do magistrado ou do tribunal na busca da correta interpretação da lei para a correta adequação ao fato, buscando sempre a justiça que é a causa e objeto final do direito.