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Evolução histórica da Responsabilidade Civil

O estudo da responsabilidade civil revela-se de grande importância, afinal, tal instituto conquistou inegável importância no direito moderno. Outrora circunscrita ao campo dos interesses privados, hoje sua seara expande-se por diversos ramos do Direito (público e privado, individual, coletivo, contratual e extracontratual, etc).

Dessa forma, o retrocitado entendimento não é diferente no Direito de Família. Neste também a responsabilidade civil atua, disponibilizando instrumentos para eficácia dos dispositivos de cunho familiar.

Para a cultura ocidental toda reflexão, a respeito das raízes de um instituto, acaba encontrando seu ponto de partida no Direito Romano. Com a responsabilidade civil esse fato não é diferente. Nas civilizações pré-romanas a preponderância deste instituto estava atrelada à concepção de vingança coletiva, onde o grupo reagia conjuntamente contra o agressor.

Posteriormente, a reação passou a ser individual, isto é, baseada na vingança privada. Uma forma selvagem talvez, por certo rudimentar, em que os homens sob a égide da Pena de Talião, isto é, da reparação do mal pelo mal, faziam justiça com as próprias mãos. Na Lei das XII Tábuas, encontra-se este critério na tábua VII, lei 11º: “si membrum rupsit ni cum eo pacit talio esto” (se alguém fere a outrem, que sofra a pena de Talião, salvo se existiu acordo). Neste período a responsabilidade não dependia da culpa, visto que, se apresentava como uma reação espontânea e natural do lesado contra o dano sofrido.

Sucede-se o período da composição. A vingança é substituída pela prestação da poena, ou seja, o prejudicado, a seu critério, receberia uma importância em dinheiro pela reparação do dano. A Lex Aquilia (lei que substituiu as penas fixas, editadas por leis anteriores, pela reparação pecuniária do dano causado, tendo em vista o valor da coisa durante os 30 dias anteriores ao delito), cristalizou a idéia de reparação pecuniária do dano, impondo que o ônus da reparação recairia sobre o patrimônio do lesante.

Dela se origina o elemento culpa como fundamental na reparação do dano. Passou-se a atribuir a noção de culpa como fundamento da responsabilidade, de tal forma que o agente se isentaria de qualquer responsabilidade se a conduta que casou o dano não fosse culposa.

Os autores da época, divididos em acirradas controvérsias, discutiam a concepção da Lei Aquiliana que só emergiu nos fins da República romana. De um lado os que sustentavam a idéia de culpa estranha à Lei Aquiliana, de outro, os defensores da sua presença como elementar na responsabilidade civil. Desta controvérsia surgiram as duas correntes, dividindo a responsabilidade civil em objetiva e subjetiva, existentes até os dias atuais.

Mais tarde o Direito Francês, aperfeiçoando as idéias românicas, estabeleceu aos poucos no Código de Napoleão um princípio geral da responsabilidade civil, introduzindo o dever de reparação quando houvesse culpa, mesmo que levíssima. É neste momento que surge a distinção entre responsabilidade civil, responsabilidade penal, responsabilidade contratual e responsabilidade extracontratual.

O advento das duas grandes guerras mundiais, inevitavelmente, impulsionou diversas transformações sociais. O avanço técnico e o conseqüente desenvolvimento industrial ocasionaram um aumento considerável do número de acidentes, onde, muitas vezes era impossível provar-se a culpa, ficando a vítima privada de ver-se ressarcida dos prejuízos sofridos.

Nestes casos a teoria clássica da culpa se tornou insuficiente para satisfazer todas as necessidades da vida cotidiana. Em virtude das dificuldades de comprovação da culpa pela vítima surge a presunção da culpa, invertendo assim o ônus da prova para o infrator.

O legislador brasileiro, no artigo 37, § 6°, da Magna Carta, estabeleceu para as Entidades Estatais a responsabilidade sem culpa, pela atuação de seus agentes que vierem a produzir lesão na esfera patrimonial ou moral de outrem. Mais adiante, representando para alguns um divisor de águas, o Código de Defesa do Consumidor de 1990 expandiu a concepção da responsabilidade objetiva, consignando-a em seus artigos 12 e 14.

Tendo em vista o prestígio e a popularidade do Código do Consumidor, talvez o microsistema jurídico que mais rapidamente alcançou o destinatário no Brasil, a teoria da imputação de responsabilidade sem culpa de exceção passou a regra. Acontece que, o direito brasileiro se manteve fiel à teoria subjetiva. No regime do Código Civil de 1916 as atividades perigosas eram definidas em lei especial. O Novo Código Civil manteve o princípio da responsabilidade com base na culpa, definindo o ato ilícito no artigo 186, in verbis: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Indispensável se faz a combinação do artigo supracitado com o que dispõe o artigo 927 do mesmo diploma legal, que explicita que o agente causador do dano fica obrigado a repará-lo. Com a moderna tendência é necessário observar o parágrafo único do próprio artigo 927, que especifica: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

Destarte, o referido parágrafo único do art. 927 do novo diploma demonstra uma postura avançada do direito brasileiro acolhendo também a teoria da atividade perigosa e o princípio da responsabilidade objetiva, a par da responsabilidade subjetiva como regra geral. Esta é, sem dúvida, a principal inovação do Novo Código Civil no campo da responsabilidade civil.

Existe ainda a possibilidade de mudança de uma responsabilidade subjetiva para objetiva quando a atividade for de risco e possuir habitualidade. Hoje em dia, baseando-se nessas inovações, pode-se dizer que existe uma equiparação entre as responsabilidades, ou seja, há duas regras gerais da responsabilidade: uma regra legal (regida pela responsabilidade subjetiva), e outra judicial, chamada de objetivação judicial (na qual prevalece a responsabilidade objetiva).