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Clamor público não justifica prisão preventiva

A mera repercussão negativa do fato, envolvendo indignação, revolta e clamor público, não é razão bastante para a decretação da prisão preventiva. O entendimento é da 1ª Câmara Criminal ao negar hoje (14/12) pedido do Ministério Público de prisão preventiva do motorista denunciado pela morte de 17 crianças e adolescentes em Erechim, bem como do dono da empresa de transporte escolar e do mecânico responsável pela manutenção do veículo.

As mortes ocorreram, em 22/9/2004, por volta das 7h, quando o ônibus que transportava as vítimas – alunos da rede pública de ensino – caiu em reservatório da Barragem da Corsan, na Linha Rio Tigre. Os estudantes morreram por afogamento.

O relator, Desembargador Manuel José Martinez Lucas, destacou que a prisão preventiva constitui situação excepcional, justificando-se apenas nas hipóteses perfeitamente enquadradas na previsão do artigo 312 do Código de Processo Penal. Deve haver, explicou, prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria, e os fundamentos da necessidade da segregação: a garantia da ordem pública ou da ordem econômica, a conveniência da instrução criminal e a segurança de aplicação da lei penal.

Enfatizou que não há nenhuma dúvida quanto à materialidade e à autoria do fato, porém, não se vislumbra necessidade da segregação cautelar dos acusados. “Não vejo qualquer ameaça à ordem pública na permanência dos réus em liberdade, situação, aliás, que se prolonga por mais de um ano”. Salientou que o motorista não continua realizando transporte escolar, não havendo necessidade de prisão para prevenção de novo evento semelhante.

“Também não se vislumbra a necessidade da prisão pela conveniência da instrução criminal. O feito, ao que tudo indica, tramita regularmente, e, embora soltos os réus, não há notícias de que tenham tentado pressionar testemunhas ou, de qualquer outra forma, interferir no normal andamento do processo.”

Acrescentou o relator que a prisão também não é necessária para assegurar a aplicação da lei penal, já que os acusados possuem vínculos na Comarca de Erechim, não havendo qualquer indício de que pretendam fugir.

Ao encerrar o voto, o Desembargador Lucas lembrou: “Diante do que se ouve e se lê nos meios de comunicação, diante da já referida repercussão do fato em comento e diante do que afirma o próprio recorrente, em suas razões, que a permanência dos réus em liberdade, durante a tramitação do feito, nada tem a ver com impunidade, chaga social contra a qual tantas vozes se levantam, com inteira Justiça, e que precisa ser definitivamente banida de nosso meio. Tal decisão, na realidade, é apenas expressão de normas constitucionais e princípios gerais do Direito, cuja observância é imperiosa, sob pena de se instaurar, através do Poder Judiciário, o mais indesejável arbítrio. É evidente, no entanto, que, vindo o réu a ser condenado, após o devido processo legal, deverá cumprir a pena, nos estritos termos da sentença que for proferida”.

Acompanharam o voto os Desembargadores Ranolfo Vieira e Marcel Esquivel Hoppe.