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Princípios protetores do direito do trabalho frente à flexibilização

O Direito do Trabalho surge da necessidade de proteger-se o trabalhador, já que este constitui a parte mais fraca da relação de emprego. Tem como objetivo atingir o máximo de igualdade possível entre empregado e empregador, a fim de equilibrar a força entre as partes e consequentemente atingir um equilíbrio, numa conservação da ordem social.

O conceito de Direito do Trabalho deixa claro a intenção de garantir-se a liberdade do trabalhador, constituindo-se de um conjunto de normas e princípios que regulam as relações de trabalho, com a finalidade de realização da justiça social. A necessidade de equilíbrio nas relações de emprego ocorre em função da subordinação jurídica do empregado ao empregador e da ignorância do empregado quanto às condições de trabalho e seus direitos. Daí, a importância do princípio protetor no Direito do Trabalho, que tem como meio para atingir essa proteção a intervenção direta do Estado, o qual impõe obstáculos à autonomia privada. Mas a rigidez nas leis trabalhistas, tem provocado a elevação de custos na prestação de serviços, contribuindo conseqüentemente para o aumento do desemprego.

Assim, buscando amenizar o problema social, muitas vezes agravado pelo aumento do desemprego, surge a “flexibilização dos direitos trabalhistas”, que, defendendo um modelo autônomo nas relações de trabalho, procura reduzir os encargos sociais, bem como o protecionismo, através de novas formas de contratação. Por outro lado, essa flexibilização tem sido discutida quanto às posições que vão de encontro aos princípios protetores do trabalhador, uma vez que, as novas formas de contratação a prazo, reduzem as disposições protetoras do trabalhador, resultando em menor garantia de justiça nas relações de emprego, desprotegendo, portanto, a parte mais fraca da relação contratual, o empregado, além de permitir irregularidades na contração por parte dos empregadores.

Sabe-se que a flexibilização do Direito Trabalhista não é um processo novo, já que vem sendo empregada em vários outros países com o objetivo de reduzir o desemprego, embora essa prática tenha se mostrado contrária ao princípio protetor, princípio este necessário para que haja justiça nas relações de trabalho e assim o trabalhador tenha respeitada a sua dignidade, além de atendida a norma fundamental do Estado Social e do Direito do Trabalho.

O princípio de proteção tem como objetivo diminuir a desigualdade entre as partes, já que o trabalhador é subordinado ao empregador, como também dele depende economicamente.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 1º, inciso III, dispõe sobre a dignidade da pessoa humana e nesse sentido garante ao indivíduo o mínimo necessário para sua subsistência e de sua família, ao tempo em que, nos seus artigos 6° ao 11 estabelece condições mínimas necessárias atendimento dos direitos sociais do trabalhador. Dispõe no art. 7° sobre os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, como também da melhoria da condição social dos trabalhadores.

O princípio da proteção, que encontra fundamento no artigo 5°, inciso I, da Constituição Federal, para alguns, engloba o in dúbio pro operario que consiste na favorabilidade do trabalhador, quando a norma tiver vários modos possíveis de interpretação, buscando, assim, a solução de um caso concreto, desde que não se trate de matéria probatória, nem afronte a nítida intenção do legislador. Para esse princípio ser aplicado é necessário que a norma tenha mais de uma interpretação, desde que estas não se afastem do significado claro da norma. Engloba ainda o princípio da norma mais favorável, o qual ocorre quando duas ou mais normas regulam uma mesma situação jurídica de modos diversos, devendo nesse caso ser aplicado a norma mais favorável ao trabalhador, independentemente de sua colocação na escala hierárquica das normas jurídicas. Há, ainda, o princípio da condição mais benéfica, que significa que uma lei posterior não pode diminuir as condições de trabalho já conquistadas pelo empregado, determinando a prevalência das condições concretas mais vantajosas para o trabalhador.

Além da proteção, o Direito do Trabalho é também fundamentado em outros princípios, quais sejam: irrenunciabilidade de direitos, primazia da realidade, continuidade, razoabilidade e boa-fé.O princípio da irrenunciabilidade é o mais atingido pela flexibilização dos direitos trabalhistas, consistindo na impossibilidade do trabalhador renunciar voluntariamente aos seus direitos, pois o empregado, por ser subordinado ao empregador não teria escolha e os renunciaria a fim de garantir o emprego. Esse princípio foi garantido pelo artigo 9º da CLT, que dispõe o seguinte: “Art. 9, CLT. Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente consolidação”.

O princípio da primazia da realidade, significa dizer que, no Direito Trabalhista, o que vale é a realidade da relação de trabalho. São os fatos determinantes da verdadeira relação contratual, que ocorrem independentemente do contrato que foi estabelecido entre as partes.

O princípio da continuidade da relação de emprego consiste na não eventualidade do labor que prossegue no tempo, visando a indeterminação da duração desse contrato em desfavor dos contratos a prazo certo. Constata-se esse princípio protetor no instituto da despersonalização do empregador, artigo 448 da CLT, na medida em que as alterações havidas na estrutura jurídica da empresa não afetam o contrato de trabalho.

Face ao princípio da continuidade e a conseqüente manutenção do contrato, o empregador investe mais no aperfeiçoamento técnico-profissional do trabalhador, garantindo à empresa uma compensatória elevação da produtividade do trabalho.

Constata-se, no entanto, que esse princípio é ferido com a flexibilização dos direitos trabalhistas, embora esteja ele consagrado pela Constituição Federal no artigo 7º, I, ao proteger a relação de emprego contra despedida arbitrária ou sem justa causa.

A exceção do princípio da continuidade, são os contratos predeterminados estabelecidos na Consolidação das Leis Trabalhistas em seus artigos. 443, § 2º, alíneas a, b e c, tendo como principal objetivo combater o desemprego e o subemprego.Com a lei n. 6.019/74, que trata do contrato temporário, a relação de emprego estabelecida passa de dual, para uma relação triangular, onde se encontra o trabalhador temporário, o tomador de serviços, e a empresa de serviços temporários. A lei estabelece a transformação do trabalho temporário em trabalho por tempo indeterminado, quando não forem observados os dispositivos legais. A empresa de trabalho temporário nessa relação possui a responsabilidade solidária.

O contrato por tempo determinado afronta o princípio da irrenunciabilidade de direitos, já que o trabalhador é subordinado e acaba renunciando a esses direitos em busca da contratação, seja por tempo determinado ou indeterminado.

A CLT em seus artigos 444 e 620 adota o princípio da proteção, permitindo às partes interessadas livre estipulação nas condições contratuais, desde que não contravenha às disposições protetoras do empregado. Porém, surge a necessidade de flexibilização do direito a fim de que sejam reduzidos os custos do empregador, favorecendo assim o aumento na oferta de empregos. Dessa forma, foi privilegiada a negociação coletiva, através da celebração de convenção e acordo coletivo.

Assim, entre outros estudiosos do assunto, Marcio Túlio Viana entende que a flexibilização nas relações trabalhistas afronta também o princípio da proteção, na medida em que desloca a proteção do empregado para o empregador, alegando que protegendo o empregador, quem ganhará com isso será o empregado. Afrontando também o princípio da continuidade do emprego, o princípio da irrenunciabilidade de direitos, induzindo a precarização do trabalho.

Entretanto, quem aceita a flexibilização como forma de aumento dos postos de trabalho, justifica-se na necessidade de reformar conceitos não mais aplicados na sociedade em que vivemos. Entre outros estudiosos, Jose Augusto Rodrigues Pinto, afirma que o principio protetor se encontra em crise, alegando que: “O Direito do Trabalho chega ao limiar do século XXI pressionado pela necessidade de repensar seus próprios princípios históricos…até mesmo o da proteção ao economicamente mais fraco”.

Porém, tal posicionamento não esta correto, pois o direito protetor não está em crise, na medida que a flexibilização de que trata o Direito do Trabalho refere-se a uma nova forma de proteção ao trabalhador com o objetivo de diminuir o desemprego.Ao tratar da flexibilização e do princípio protetor, Ana Virginia Gomes Moreira considera que:

… reformas constitucionais e legislativas que representem a desregulamentação ou flexibilização do Direito Laboral implicam a impossibilidade de aplicação do princípio protetor e a predominância absoluta do princípio da autonomia privada”. Percebe-se a necessidade de uma forma de flexibilização mais protetiva, passível de compatibilizar os interesses dos trabalhadores e das empresas, sem desproteger o empregado, garantindo ainda os princípios constitucionais conquistados através de lutas ao longo do tempo.