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Defensoria Pública e Direito do Trabalhador

É sabido que a Constituição Federal brasileira (CF) é carta suprema protetora dos interesses da República Federativa do Brasil e também, por conseqüência, dos interesses sociais de justiça em respeito ao princípio da isonomia constitucional.Essa posição é explicitamente demonstrada em diversos dispositivos textuais do Diploma Excelso como, p. ex., em seu preâmbulo, nos seguintes termos:

“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos (…) para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar (…) a igualdade e a justiça como valores supremos (…)”.

A mesma idéia é encontrada, também, no art. 5º, LXXIV, da CF, in verbis:”Art. 5º. (omissis);(…)LXXIV – o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.

A Constituição do Estado de São Paulo (CESP) segue, por sua vez, o mesmo caminho ao transcrever o dispositivo constitucional pré-posto em seu art. 3º, estabelecendo a assistência judiciária gratuita e integral como fundamento desse ente federativo.O que é estabelecido pelos dispositivos constitucionais supra é o direito à prestação jurisdicional plena, decorrente do princípio da indeclinabilidade da prestação jurisdicional (1)

A prática jurídica da área trabalhista no Estado de São Paulo (em contencioso perante a Justiça do Trabalho) demonstra que essa assistência jurídica gratuita é utópica e causa aos trabalhadores carentes uma triste ilusão, posto que nenhum órgão público luta pelos direitos trabalhistas nesse Estado, conforme os seguintes informes dos respectivos órgãos públicos:

1. Defensoria Pública da União – instituída pela Lei Complementar n. 80, à este órgão foi incumbida a “prestação de assistência jurídica, judicial (…), integral e gratuita, aos necessitados (…)” (art. 1º, LCP n. 80). Mas, o art. 4º arrola as hipóteses em que a Defensoria Pública da União pode patrocinar ações, a saber: “(…) Ação Penal privada e a subsidiária da pública” (art. 4º, II); “(…) ação civil” (art. 4º, III); “(…)defesa em Ação Penal” (art. 4º, IV); “(…) defesa em ação civil e reconvir (art. 4º, V).

2. Procuradoria do Estado – Estabelece o art. 3º da Lei Orgânica da PGE suas atribuições, a saber: “representar judicial e extrajudicialmente o Estado e suas autarquias, inclusive as de regime especial, exceto as universidades públicas estaduais” (art. 3º, I); “exercer as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo e das entidades autárquicas a que se refere o inciso anterior” (art. 3º, II); “zelar pelos interesses do erário estadual perante o Tribunal de Contas” (art. 3º, III); “exercer as funções de consultoria jurídica e de fiscalização da Junta Comercial do Estado” (art. 3º, IV); “prestar assessoramento jurídico e técnico-legislativo ao Governador” (art. 3º, V); “promover a inscrição, o controle e a cobrança da dívida ativa estadual” (art. 3º, VI); “propor ou contestar as ações judiciais que tenham por objeto a defesa do erário ou do interesse público, bem como nelas intervir, na forma da lei” (art. 3º, VII); “prestar assistência jurídica aos Municípios, na forma a ser disciplinada pelo Procurador Geral do Estado” (art. 3º, VIII); “realizar procedimentos administrativos, inclusive disciplinares, não regulados por lei especial” (art. 3º, IX); “acompanhar inquéritos policiais sobre crimes funcionais, fiscais ou contra a Administração Pública e atuar como assistente da acusação nas respectivas ações penais, quando for o caso” (art. 3º, X); “patrocinar as ações diretas de inconstitucionalidade e as argüições de descumprimento de preceito fundamental propostas pelo Governador, acompanhando e intervindo naquelas que envolvam interesse do Estado” (art. 3º, XI); “definir, previamente, a forma de cumprimento de decisões judiciais” (art. 3º, XII); “propor a extensão administrativa da eficácia de decisões judiciais reiteradas” (art. 3º, XII); “promover a uniformização da jurisprudência administrativa e da interpretação das normas, tanto na administração direta como na indireta” (art. 3º, XIV); “manifestar-se conclusivamente sobre as divergências jurídicas entre quaisquer órgãos ou entes da administração estadual direta ou indireta” (art. 3º, XV); “opinar previamente em todos os contratos, convênios, consórcios ou atos negociais similares celebrados pelo Estado, sob pena de invalidade” (art. 3º, XVI); “representar o Estado e as autarquias estaduais nas assembléias gerais das sociedades de que sejam acionistas” (art. 3º, XVII); “promover a discriminação de terras e a regularização fundiária no Estado” (art. 3º, XVIII); “representar ao Governador sobre providências de ordem jurídica reclamadas pelo interesse público e pela boa aplicação das normas vigentes” (art. 3º, XIX); “coordenar e supervisionar tecnicamente os órgãos jurídicos das universidades públicas estaduais, das empresas públicas, das sociedades de economia mista sob controle do Estado, pela sua Administração centralizada ou descentralizada, e das fundações por ele instituídas ou mantidas” (art. 3º, XX); “gerir e administrar os fundos especiais de despesa que lhe são afetos” (art. 3º, XXI)

Outros estabelecimentos que oferecem assistência judiciária gratuita no Estado de São Paulo, como o Centro Acadêmico XI de agosto, a Casa do Advogado e a Ordem dos Advogados do Brasil, também não abrangem a área trabalhista.

Conclui-se a fatalidade de que a prática jurídica no âmbito do Direito do Trabalho no Estado de São Paulo não se amolda aos termos constitucionais, seja na esfera federal, seja na sua própria esfera.

Para que este trabalho não se enraíze na praxe da crítica vazia, faz-se necessário adequá-lo a função social, oferecendo eventual solução a essa inconstitucionalidade.

Pois bem, em consciência de que a Justiça do Trabalho é uma especialidade da Justiça Federal, uma solução é trazida, a saber: a) efetuação de convênios entre a Defensoria Pública da União e outra(s) entidade(s) pública(s) para lutar em prol dos trabalhadores em eventuais lides jurídicas (2)

Passemos a analisar com maior riqueza de detalhes a solução previamente citada. Como já citado a Lei Complementar n. 80, datada do dia 12 (doze) de janeiro de 1994, organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios além de prescrever normas gerais para sua organização nos Estados. Seu art. 14 tratava, inicialmente, de forma genérica sobre a atuação da Defensoria Pública, in verbis:

“Art. 14. A Defensoria Pública da União atuará nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios, junto às Justiças Federal, do Trabalho, Eleitoral, Militar, Tribunais Superiores e instâncias administrativas da União”.

No exercício de seus poderes, o Congresso Nacional legislou (3), posteriormente, a inclusão de 3 (três) parágrafos no art. 14 da LCP n. 80, dentre eles, o que mais interessa a esta análise é o parágrafo segundo, in verbis:

“Art. 14. (omissis).(…)

§ 2º. Não havendo na unidade federada Defensoria Pública constituída nos moldes desta Lei Complementar, é autorizado o convênio com a entidade pública que desempenhar essa função, até que seja criado o órgão próprio”.

O Estado de São Paulo possui um departamento na Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho (SERT) que orienta os trabalhadores acerca da legislação trabalhista. Seus orientadores são advogados concursados. Assim sendo, é possível a instituição de convênio entre a Defensoria Pública da União e a SERT para que esses advogados possam pleitear pelos direitos trabalhistas de operários de baixa renda perante a Justiça do Trabalho em contencioso.

Entretanto, como estabelecido no parágrafo segundo do art. 14 da LCP n. 80, só há possibilidade da Defensoria Pública da União efetuar convênios com outros órgãos públicos se não haver no Estado Defensoria Pública constituída nos moldes da lei pré-posta. Essa solução é viável, para o Estado de São Paulo, a curto prazo, pois, o Governador desse Estado está em iminência de instaurar uma Defensoria Pública nessa entidade federativa. Diz-se “curto prazo”, pois, é notória a existência de um abismo moroso entre a autorização de implantação de uma Lei Orgânica e, enquanto não há a regularização dessa Lei Orgânica, é viável ao Brasil, em respeito do princípio do direito da prestação jurisdicional plena, que os advogados orientadores trabalhistas assumam a competência de defesa pública em contencioso em prol dos trabalhadores necessitados perante a Justiça do Trabalho, ficando, posteriormente, a cargo da Defensoria Pública do Estado ou da própria União, em convênio com a pré-posta, dar continuidade batalha da justiça trabalhista.

NOTAS:

(1) Art. 5º. (…). XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário a lesão ou ameaça a direito.

(2)Sugestão viável em caso de não haver Defensoria Pública na entidade federada.

(3)Desse exercício do poder de legislar nasceu a Lei Complementar n. 98 de 3 de dezembro de 1999.