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Lei não pode suprir todas as mazelas da sociedade

Para muitos fatos sociais, apresenta-se a Lei como solução, na busca de respostas que a esta não pode ofertar. Em vista disso, a série de modificações legislativas que terminam por ocorrer não produzem o resultado esperado. “Busca-se na Lei dar uma resposta à sociedade sobre a criminalidade, por exemplo, quando se sabe que será insuficiente. As leis são severas, drásticas e isso não resolve o problema”, atenta o Juiz de Direito Gilberto Shäfer, professor de Direito Constitucional, Mestre em Direito Público e titular da 1ª Vara Cível do Foro de Guaíba, durante sua participação ontem à noite (25/3) no programa “Justiça Gaúcha”, quando falou sobre a produção de leis.

Para o magistrado, a Constituição de 1988, do ponto de vista qualitativo, ainda alicerça o nosso país, oferecendo ferramentas importantes para a construção de um Estado Democrático de Direito. “É uma Constituição cidadã.”

O magistrado aponta que, a rigor, deve-se falar em produção normativa, pois vários tipos de normas são produzidos, a saber leis constitucionais, leis ordinárias e complementares, resoluções e decretos. Quando essas normas não são seguidas, ocorrem dois tipos de desobediência: ao regramento constitucional, já que a Constituição estipula como serão feitas essas regras; e ao regramento regimental, visto que as regras precisam ser complementadas, o que é feito pelo próprio parlamento, através de resoluções – regimentos internos do Congresso Nacional, da Assembléia Legislativo e das Câmaras Municipais. A infração do primeiro regramento é considerada uma inconstitucionalidade, enquanto a transgressão do segundo, na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), é considerada uma simples irregularidade de âmbito interno, e a própria casa administrativa vai avaliar se o regramento para a produção de normas foi seguido adequadamente.

O Juiz de Direito alerta também para a existência, no plano federal, de duas casas legislativas, a Câmara dos Deputados, que representa o povo, e o Senado Federal, representando os estados. No entanto, esse bicameralismo é simétrico, pois a maioria dos projetos passa pelas duas casas, o que não acontece em muitos países. Alerta ainda para a observância dos planos nacional, estadual e municipal que, enquanto elementos constitutivos da federação, devem ser seguidos sob pena de inconstitucionalidade.

Sobre as cortes constitucionais, aponta para a possibilidade de que não sejam magistrados de carreira, mas sim Juízes escolhidos através de um procedimento especial. “Não sei se o nosso sistema é bom o suficiente, mas certamente ele tem algumas qualidades e poderia ser aperfeiçoado”, avalia. Um dos aperfeiçoamentos, sugere, seria a quarentena para que membros do Executivo ocupassem cargos do Supremo Tribunal Federal. O magistrado salienta ainda que as nomeações do Presidente da República para o Supremo Tribunal Federal contribuem para que as decisões sejam debatidas mais profundamente, já que não existe uma maioria pré-definida e os Ministros, freqüentemente, pedem vista dos processos para firmarem sua posição. “Isso é muito interessante para a fortificação da jurisprudência (…), o STF está dividido, mas positivamente.”

O processo legislativo pode ser iniciado por qualquer membro da Câmara dos Deputados ou do Senado, pelo Presidente da República, pelos Tribunais ou, até mesmo, por uma iniciativa popular, através do recolhimento de assinaturas, seguido de encaminhamento de um projeto de lei ao Congresso Federal e posterior decisão na Câmara dos Deputados. Entretanto, é importante notar que alguns projetos têm iniciativa privativa e só podem ser apresentados por pessoa ou órgão determinados na Constituição. “Criação de cargos, aumento de despesas, modificação do efetivo das Forças Armadas, por exemplo, são de competência privativa do Presidente”, esclarece.

O magistrado atenta para as Medidas Provisórias que, editadas privativamente pelo Presidente da República, têm força de lei, embora submetam-se aos requisitos de urgência e relevância. Porém, atualmente, esses critérios não existem ou são muito questionáveis. Segundo Gilberto Shäfer, o STF falhou em não se dispor, logo no início, a avaliar esses requisitos, afirmando que isso era competência do Congresso e do Presidente. Recentemente, o STF passou a considerar essa jurisprudência, assegurando que a urgência e a relevância seriam analisadas quando houvesse um flagrante abuso.

(Douglas Ceconello)