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Em decisão inédita, STJ classifica discriminação e preconceito como racismo

O Superior Tribunal de Justiça julgou a incitação ao preconceito ou à discriminação de raça uma prática racista e manteve a condenação do editor de livros Siegfried Ellwanger por editar e vendar obras com mensagens anti-semitas. No STJ, trata-se de uma interpretação inédita ao artigo 20 da Lei 7.716 – “praticar, induzir ou incitar, pelos meios de comunicação social ou por publicação de qualquer natureza, a discriminação ou preconceito de raça”. Pela Constituição, o racismo é crime imprescritível e inafiançável.

Condenado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a dois anos de reclusão, com sursis (suspensão condicional da pena) pelo prazo de quatro anos, o editor de livros entrou com habeas-corpus no STJ para que fosse retirada da condenação a acusação de racismo. Assim, ele estaria em condições de requerer a extinção da pena. Ao réu foi imposta a pena de dois anos prevista no artigo 20 da Lei 7.716, com nova redação da Lei 8.081, pela “edição e venda de livros fazendo apologia de idéias preconceituosas e discriminatórias”.

A defesa sustentou que Ellwanger não poderia ser condenado pela prática do racismo, pois o “incitamento contra o judaísmo”, do qual foi acusado, não teria conotação racial. “Entretanto, penso que deve ser ressaltado que a condenação do paciente se deu por delito contra a comunidade judaíca, não se podendo abstrair o racismo de tal comportamento”, disse o relator do habeas-corpus, ministro Gilson Dipp, no voto adotado pela maioria do colegiado da Quinta turma. A decisão do TJ, segundo ele, “foi suficientemente clara e motivada nesse sentido, sendo descabida a pretendida reavaliação de seus fundamentos”.

Para sustentar a alegação de que o réu não cometeu crime de racismo, os advogados do editor sustentaram que ‘judeu não é raça, mas povo”. A tese é reforçada com citação de um trecho da declaração da Unesco sobre as diferenças raciais: “Os muçulmanos, os judeus não formam uma raça, assim como os católicos ou os protestantes…”. Segundo eles, a definição de judeu como raça “encontra sempre o veemente repúdio de toda a comunidade judaíca, tanto pelos antropólogos judeus, pelos rabinos e pela sua intelectualidade”.

“Entendo que não há que se fazer diferenciação entre as figuras da prática, da incitação ou do induzimento, para fins de configuração do racismo, eis que todo aquele que pratica uma destas três condutas discriminatórias ou preconceituosas, é autor do delito de racismo, inserindo-se, em princípio, no âmbito da tipicidade direta”, afirmou Dipp. Tais condutas, segundo ele, “caracterizam um crime formal, de mera conduta, não se exigindo a realização do resultado material para a sua configuração, bastando, para tanto, a concretização do comportamento típico, como descrito na legislação, com a intenção de sua realização”.