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Correntista vence disputa com Sudameris e STJ confirma saldo positivo de Cz$ 166,4 milhões

O Superior Tribunal de Justiça reconheceu saldo positivo de Cz$ 166,4 milhões, em valores da moeda de julho de 1987, na conta-corrente do empresário e engenheiro Marco Túlio Abrão e não um saldo negativo de Cz$ 277,9 milhões, como alegou o Banco Sudameris Brasil S/A. A Terceira Turma do STJ adotou, por unanimidade, o voto do relator, ministro Antônio de Pádua Ribeiro, e manteve a decisão do Tribunal de Justiça de Goiás favorável ao empresário. Para o TJ, o banco é responsável pelos atos praticados pelos prepostos (gerentes) relacionados à liberação de crédito para cheques sem fundos.

O conflito está relacionado ao movimento da conta-corrente de Marco Túlio na agência do Sudameris em Goiânia no período de maio de 1987 a 30 de julho do mesmo ano. O Sudameris sustenta ser vítima de fraude “ardilosamente arquitetada” por seus próprios gerentes e pelo correntista. Marco Túlio fazia depósitos de cheques sem fundos na conta-corrente do Sudameris, imediatamente liberados pelo gerente para saques. O correntista, por sua vez, afirma que houve saques indevidos em sua conta-corrente, sem sua autorização expressa, realizados por gerente e chefe-executivo do banco, por meio de falsificação de documentos.

A batalha judicial teve início em 1987, quando Marco Túlio entrou na Justiça com ação de prestação de contas. Ele alegou que, apesar de vários pedidos de esclarecimentos aos funcionários da agência, não havia obtido qualquer explicação sobre irregularidades na movimentação de depósitos e saques de sua conta corrente. Ao invés de prestar contas, afirmou, o Sudameris promoveu protesto judicial.

Sentença de primeiro grau reconheceu a ocorrência de fraude e considerou corretas as demonstrações de depósitos e saques apresentadas pelo banco, com saldo negativo de Cz$ 277,9 milhões na conta do empresário. O Tribunal de Justiça de Goiás anulou a sentença e decidiu em favor de Marco Túlio. Ao examinar o caso pela primeira vez, a Terceira Turma do STJ anulou a decisão de segundo grau e determinou novo julgamento para que fossem analisadas as contas apresentadas pelo banco. Feito esse exame, o TJ confirmou saldo positivo para o correntista, o que levou o Sudameris a apresentar novo recurso no STJ.

A instituição sustentou que o TJ, ao invés de examinar as contas por ela apresentada, extrapolou os limites da ação, para emitir juízo de valor próprio às discussões sobre responsabilidade civil. Segundo ela, as contas bancárias da empresa Transgoiânia, pertencente a Marco Túlio, foram usadas indiscriminadamente em proveito do mesmo e com favorecimentos irregulares dos gerentes do Sudameris.

O ministro Antônio de Pádua Ribeiro rejeitou as alegações do banco e julgou a decisão do TJ bem fundamentada, sem qualquer conflito entre a fundamentação e a conclusão, como alegou o Sudameris. Em última análise, afirmou, para examinar todas as argumentações do banco haveria necessidade do reexame de provas, o que é incabível em recurso especial. Pádua Ribeiro citou votos dos desembargadores José Soares de Castro e Charife Oscar Abrão, nos quais, segundo ele, ficou demonstrada a análise detalhada e correta das operações de débito e crédito realizadas na conta do empresário e a preocupação de atender à determinação do STJ.

O TJ concluiu que o banco é responsável pelos atos de seus prepostos (gerentes), que autorizaram a liberação do crédito ao correntista, mediante documento de crédito (docs), sem a devida provisão de fundos em conta-corrente. Auditoria interna realizada pelo Sudameris concluiu que o então gerente da agência de Goiânia, Gilberto Ialma do Amaral, teve “responsabilidade integral” pela liberação do crédito. O relatório aponta também a conivência do então chefe-executivo da agência, Edson de Araújo. O resultado da auditoria, segundo o TJ, mostra com clareza o expediente negligente dos gerentes, que violaram normas do Banco Central em relação às atividades das câmaras de compensação.

O correntista realizava o depósito de cheque do Banco de Boston, agência de Brasília, a ser compensado em 48 horas, e tinha o crédito correspondente liberado imediatamente. Essa operação bancária, segundo o TJ, é de total responsabilidade do Sudameris, “já que somente as instituições financeiras é que participam, diretamente, das Câmaras de Compensação, recebendo o depósito bancário à sua total responsabilidade formal pelo documento, independentemente da provisão de fundos”.

O desembargador José Soares de Castro rejeitou também a alegação de que Marco Túlio desviou dinheiro indevidamente. “As operações contábeis competiam estritamente aos agentes da instituição bancária, sendo de lembrar que é princípio consagrado no direito brasileiro de que o patrão responde pelos atos ilícitos de seus empregados, quando executados no exercício de suas funções”, afirmou. A demissão dos funcionários envolvidos nessas operações, segundo ele, representou um reconhecimento expresso de culpa do banco “pelos atos e falhas verificados no sistema bancário administrado naquela agência”.

Na análise das contas apresentadas pelo Sudameris, o TJ desconsiderou o lançamento de vários cheques como débito na conta-corrente de Marco Túlio por não terem sequer sido depositados, mas apenas entregues ao gerentes do banco. Dissociar os gerentes do banco, segundo o TJ, seria negar a própria existência da instituição financeira que “se personifica através de seus diretores e funcionários”.

Fundamentado em laudos periciais, o TJ concluiu que ao saldo credor de Cz$ 33.795,03 registrado na conta-corrente de Marco Túlio em final de julho de 1987 deveriam ser acrescentadas verbas retiradas, indevidamente, da conta sem autorização expressa do correntista, nos valores de Cz$ 41,5 milhões, Cz$ 68,1 milhões e Cz$ 59,1 milhões. Com essa soma, o saldo positivo chegou a Cz$ 168,8 milhões. Desse montante, foram descontados os encargos de Cz$ 2,2 milhões, relativo aos juros de julho de 1987. O Tribunal de Justiça chegou ao crédito positivo de Cz4 166,5 milhões, que deve ser atualizado monetariamente e acrescido de juros a partir de julho de 1987.