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Justiça do Rio nega recurso da Bradesco Seguros que recusou internação de aidético

A 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis do Rio de Janeiro negou, por unanimidade de votos, recurso da Bradesco Seguros, que descumpriu decisão do 8º Juizado Especial Cível e recusou o pedido de internação, no dia 5 de novembro de 2000, do comerciante aposentado Roberto de Jesus Santos, portador do vírus da Aids. O comerciante faleceu quinze dias depois, aos 52 anos, no setor de emergência do Hospital Evangélico do Rio de Janeiro, na Tijuca. A seguradora foi condenada ao pagamento das custas do processo.

A relatora do recurso, juíza Maria Cândida Gomes de Souza, determinou o envio imediato de cópias do mandado de segurança ao Ministério Público para instauração de processo criminal. Também serão enviadas cópias ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica, ao Sistema Nacional do Consumidor e ao Conselho Nacional de Seguros Privados. Acompanharam o voto da relatora, os juízes Ana Maria Pereira de Oliveira e Augusto Alves Moreira Júnior.

Em seu voto, a relatora rejeitou a alegação da seguradora – não comprovada no processo – de que as despesas decorrentes das internações de um paciente portador do vírus da Aids são superiores a 40 salários mínimos, valor máximo permitido em sede de Juizados Especiais Cíveis. Segundo a juíza, o valor da causa, quando se discute a existência, validade, cumprimento ou rescisão de negócio jurídico, é o valor do contrato, que se traduz “no valor das prestações a que se comprometeu a parte para atendimento do objeto das coberturas daquele plano”.

Quanto à alegada exclusão de doenças relativas à Aids do plano de saúde, a juíza afirmou que “não é a questão que determinaria ou não sua internação, senão o estado emergencial em que se encontrava, o que se demonstrou, de forma trágica, com seu falecimento, que ocorreu antes de conseguir a extração do mandado que determinava novamente sua internação”.

“A gravidade da situação revelada através dos autos nos deixa a pergunta de até quando atuarão as empresas de saúde com tamanha impunidade, por quanto tempo ficarão ao largo, sob o manto de uma pessoa jurídica que esconde ilícitos muito mais graves que a violência com que lidamos diuturnamente através das trágicas manchetes de jornais?”, indagou a juíza.

A relatora declarou também que “após receber todos os lucros por tanto tempo, já que até então, era aquele beneficiário, pessoa saudável, deixou-o ao abandono, em total desrespeito ao direito fundamental daquele à sua dignidade, saúde e vida”.

Ela também questionou: “Por quanto tempo permanecerão ignorando a lei, a Constituição, os princípios morais e éticos que devem inspirar toda atividade empreendida em uma sociedade, principalmente aquelas que destinam sua atividade a cuidar de seres humanos, de sua saúde, tendo por finalidade sua preservação e bem estar?”

Ao concluir seu voto, a relatora destacou que a seguradora negou ao aposentado “o acesso à internação, frise-se, que o Judiciário já havia determinado, descumpriu ordem emanada deste Poder e ainda tem a ousadia de travestir-se de prejudicado por violação de seus direitos, impetrando o presente mandado, que mais se afigura uma afronta, que a impunidade de décadas permitiu”.

Roberto de Jesus celebrou contrato com a Multi-Saúde Bradesco/Bradesco Seguros em 29 de abril de 1992, o que lhe deu direito à internação hospitalar em quarto com banheiro privativo, tratamento ambulatorial e garantia de reembolso de despesas de assistência médica e/ou hospitalar. Nos oito anos do contrato, o comerciante efetuou os pagamentos em dia, tendo pago, na última mensalidade, R$ 375,67. O comerciante constatou a doença nos dois últimos anos de vida.

O mandado de segurança foi proposto pela Bradesco Seguros contra decisão do juiz Mauro Pereira Martins, do 8º Juizado Especial Cível, que determinou a internação do aposentado, no prazo de 24h, sob pena de multa diária no valor de um salário mínimo. Na ocasião, o juiz ressaltou que excluir o direito de internação do paciente em casos graves e emergenciais, não se compatibilizam com as normas do Código de Defesa do Consumidor.